O pacto fechado depois da tragédia deixou nas mãos de uma fundação, a Renova --criada pelas mineradoras-- a aplicação de recursos repassados pelas empresas para o andamento das reparações. A fundação afirma ter gasto até agora R$ 15,5 bilhões com indenizações, obras e projetos.
Os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, porém, dizem que não estão satisfeitos com o andamento das reparações e querem passar a ter maior autonomia para aplicação de recursos.
"Estamos numa mesa de repactuação perante o CNJ. Vamos tentar fazer uma remodelagem daquela pactuação inicial, porque se mostrou muito burocrática", afirma o procurador-geral do Espírito Santo, Jasson Hibner Amaral.
Ele afirma que decisões que já tinham sido tomadas entre as partes dentro do processo de reparação foram levadas à Justiça pela Renova.
"Não estou fazendo uma crítica apenas à fundação, mas ela judicializou muitas questões (...). Então, ao invés de atingirmos o objetivo, que era restaurar a dignidade de atingidos, restaurar economicamente regiões atingidas, restaurar o meio ambiente, a questão virou uma espécie de guerra de pareceres", avaliou.
O procurador disse ser necessário um novo modelo para reparação da tragédia, mas afirmou que ainda não há uma definição de qual seria o formato ideal..
Um dos pontos que o procurador julgou serem modificados é quanto ao gerenciamento de recursos da reparação para a área da saúde. "Por exemplo, o fortalecimento do serviço público de saúde. Se houve adoecimento de pessoas por conta da contaminação da água, a gente entende que pode reforçar a estrutura de unidades de saúde", apontou.
Em Minas Gerais, a avaliação do governo é que a Renova fez muito pouco no processo de reparação. "As pessoas não foram devidamente indenizadas, ações ambientais estão muito atrasadas e os municípios não receberam praticamente nada", apontou a secretária de Planejamento do estado, Luísa Barreto.
Segundo a Renova, os municípios mineiros e capixabas impactados pelo rompimento da barragem de Fundão têm a disposição R$ 370 milhões em recursos compensatórios para estrutura das redes de atenção à saúde e para assegurar a integralidade do cuidado e da assistência médica aos atingidos e à população em geral.
Conforme a nota da fundação, parte dos recursos, cerca de R$ 150 milhões, foi depositada em juízo no dia 20 de setembro. "Os recursos de caráter compensatório, desembolsados antes e durante a pandemia causada pelo novo coronavírus, representam no médio e longo prazo investimentos em ações estruturantes na área de saúde para as comunidades atingidas", disse o texto.
O ideal para o governo de Minas, conforme a secretária, é o fechamento de um novo acordo nos moldes do acertado com a Vale pela tragédia de Brumadinho, em que a distribuição dos recursos fica a cargo do estado. "É um modelo que permite uma reparação mais ágil", disse Barreto.
No acordo feito para Mariana não há uma previsão do total de recursos a serem gastos na reparação. Já no de Brumadinho, há uma espécie de piso de R$ 37 bilhões para reparação -ele pode ser maior, mas não menor.
A Renova afirmou ainda que atendendo a um TTAC (Termo de Transação e de Ajustamento de Conduta) trabalha na execução de uma série de ações e medidas necessárias à reparação dos municípios atingidos pelo rompimento da barragem.
Sobre as 85 mil ações na Justiça envolvendo reparação pela tragédia de Mariana, a Renova afirmou que está previsto que qualquer situação que não possa ser resolvida pelas partes signatárias no acordo original ou que seja objeto de divergência de interpretação deverá ser encaminhada à Justiça.
A BHP por nota disse que sempre esteve presente em todas as tratativas que buscam acordos judiciais e extrajudiciais para dar celeridade ao processo de reparação. Afirmou ainda que tem participado ativamente das discussões de repactuação intermediadas pelo CNJ, "que buscam acelerar ações que garantam uma reparação justa e integral aos impactados".
A Samarco, também por nota disse reafirmar seu compromisso com a reparação de danos e que, até o momento, foram indenizadas mais de 336 mil pessoas, "tendo sido destinados mais de R$ 15,57 bilhões para ações executadas pela Fundação Renova". A Vale não retornou contato feito pela reportagem.