O que se pode dizer depois da morte de um amigo?
Como alinhavar os pensamentos depois que a moça caetana leva alguém que você esperava para uma conversa de fim de expediente, sentado na recepção da Câmara Municipal, enquanto se aguarda o transporte?
O que dizer ao coração inquieto pela perda inesperada?
Como aquietar a ansiedade da certeza que a indesejada das gentes não respeita nem as lendas?
Como fazer para escrever alguma coisa sobre um momento em que se perde, para as parcas malditas, um amigo chamado RAMIRO GUEDES DA LUZ?
Num momento em que o infeliz ceifador vem fazer a cobrança do tempo de vida, transformando vida em morte e luz em sombra, a única lembrança que nos é permitida é a de que, na partida de um homem que carregava nas palavras e na voz a única mensagem que clareava, em tempos trevosos, o caminhar de muitos, temos a obrigação de lhe prestar todas as homenagens possíveis.
Meu amigo Ramiro, que Caronte seja delicado na travessia do Aqueronte, e que as musas cantem os versos imortais do imortal poeta; que os ventos do campo eterno faça esvoaçar seus pensamentos mais luminosos, e os traduzam em luminosas notas de alegria encaminhadas aos seus familiares e amigos que aqui ficam acompanhados da tristeza e da saudade.
Meu amigo Ramiro, vou repetir aqui, pela última vez a nossa saudação poética de todo dia:
“Assobe, assobe gajeiro
Naquele mastro real!
Vê se vê terras de Espanha
Otolina, areias de Portugal
Alvissaras, meu capitão
Meu capitão-general
Que avistei terras de Espanha
Otolina, areias de Portugal.”
Meu amigo Ramiro, que sem o Guedes praticamente inexistia no imaginário do povo que o admirava, nas palavras do velho bardo lusitano, o meu beijo, o meu abraço, a minha saudade:
“Cesse tudo o que a Musa antiga canta
Que outro valor mais alto se alevanta”
Vá com Deus meu querido amigo.
Do seu amigo Borges Sampaio.